quinta-feira, fevereiro 25, 2021

Emboscada

Emboscada


Guerreiros atentos caminham cautelosamente por entre árvores milenares, com armas e escudos em punho. Neve incessante deposita-se aos poucos entre as frestas de suas armaduras, suas longas barbas e capacetes. Não passam de oito e quem guia o pequeno grupo é um guerreiro de renome, Ingmund Teiwar.

Sob o comando brusco e silencioso de Ingmund, seus comparsas param subitamente. Todos focam sua atenção para o que parece ser a saída da densa floresta. Pouco antes de retomarem a marcha lenta e cuidadosa, uma flecha assovia entre as árvores, acertando em cheio o rosto de um dos guerreiros.

Sem muita chance de reação, arqueiros revelam-se sob as copas das altas árvores. Eram muitos. O zumbido único da flecha logo trouxe consigo um verdadeiro enxame, uma saraivada letal recaiu sobre o grupo. Ingmund Teiwar levantou seu grande escudo de madeira-ferro. Aparou algumas flechas e buscou cobertura em um gigante tronco, sem antes ser atingido por duas flechas, uma em seu ombro, outra na coxa.

O resto do destacamento protegeu-se como conseguiu, porém as setas atravessaram peito, coração e cabeça de grande parte deles. A neve branca destacou o sangue derramado em solo sagrado.

Após cessar o som das flechas, misturado com grunhidos abafados, daqueles que foram fatalmente atingidos, silêncio instaurou-se entre as árvores. Os arqueiros voltaram-se a esgueirar-se entre as copas quilométricas. Uma voz estridente ressoa, rompendo a mórbida quietude da floresta

_Ingmund Teiwar! Não há saída!

A voz, que mais parece o grito de um animal sendo abatido, surge vindo de todas as direções. Uma voz conhecida por Ingmund, a voz do infame e covarde Mor Vinir. Seus acordos nefastos com criaturas malignas da floresta lhe conferiram não só uma reputação lamentável, como poderes sombrios além da compreensão da maioria das pessoas. 

Surgiu diante de Ingmund, a cerca de 10 metros, uma cabeça. Esta cabeça possuía o tamanho e o formato de uma cabeça humana. Cabelos compridos e ralos escorriam pela face. Olhos afundados em um semblante de dor. Lábios repuxados e secos, não podiam esconder seus dentes afiados. 

Ingmund segurou firme o cabo da espada e sentiu o sangue escorrer pelo seu braço. Tinha a confiança que, daquela distância, seria capaz de atingir qualquer criatura de forma letal. Sentiu seus músculos contraírem involuntariamente. Tentou movimentar-se, mas não pode, estava paralisado. Presumiu veneno nas flechas, mas não descartou os poderes sobrenaturais de Mor.

A cabeça diante de Ingmund, começou a aproximar-se lentamente. A voz agonizante questiona: Quando suas ações deixaram de fazer sentido, Ingmund? Não se arrepende do que fez com seu pai? E seus irmãos? Posso ouvi-los daqui cantando a toada do eterno verão. 

O corpo de Mor surge gradativamente conforme se aproxima. Toca gentilmente a face de Ingmund, que consegue apenas emitir grunhidos indecifráveis, enquanto escorre saliva espumante de sua boca. “Um animal Indefeso”, Diz Mor em tom de compaixão e pena.

Ingmund começa a perder a consciência e ouve a voz de Mor dentro de sua cabeça, um assovio estridente questiona: PARA ONDE VOCÊ OS LEVOU??

A sensação de cair em um vazio sem ter onde se agarrar, leva Ingmund para dentro de sua própria mente. Na imersão de seus sentidos, encontra-se em reino onírico. Nota que seus braços estão acorrentados, está sendo conduzido por More através de suas próprias lembranças. 

As primeiras imagens que surgem são de sua vila, imagens banais de sua infância em Huur, os rostos de seus pais e irmãos. Sua adolescência, suas brigas e desafetos, suas vergonhas e seus amores. As lembranças parecem reais, com apenas um detalhe: em todas elas, em algum lugar está a presença do infame Mor Vinir. 

Sua memória então repousa em sua iniciação como protetor do clã Teiwar. Diante dele está seu avô e patriarca Kaak a lhe entregar a espada que empunha até hoje. Mor Vinir, neste momento, revela-se a poucos metros de Kaak, manchando esta lembrança com sua presença espectral. 

Kaak olha profundamente para os olhos de Ingmund e em vez de recitar os votos sagrados do clã, como sempre faz em suas lembranças, disse, profundamente com voz grave e retumbante: DESPERTE! Sentiu todo o seu corpo arrepiar e pode testemunhar Kaak, virando-se pra desferir um golpe violento na presença sombria de Mor Vinir.

O arrepio sobe sua coluna e ao despertar, sente todo seu corpo formigar de ódio. Mor está em sua frente, ainda recobrando a consciência. Com um movimento preciso, sem precisar fazer muito esforço, Ingmund  atravessa a horrenda cabeça de Mor com sua espada.

Após o corpo cair debilmente no chão, sua visão depara-se com incontáveis arqueiros. E incontáveis flechas caem em sua direção. 

Dan. D

Nota: Este conto é inspirado em um mundo criado junto com meus amigos através de muitas campanhas de R.P.G. Neste caso, a história se passa no norte deste mundo. É um conto ancestral que conta a formação dos antigos clãs.

terça-feira, junho 18, 2019

Verbo Ver

Oi, tem alguém por ai? Não é que este blog tornou-se um Museu? Ótimo! Talvez um ponto ermo no meio da internet. Sabe aquele cantinho da cidade que você encontra,  e ele vira, o seu cantinho? Não tem ninguém, só você e seus vícios...

Verbo Ver

No caminho para o trabalho cochilou. Encostou a cabeça no vidro do circular por nem dez minutos; suficiente para sonhar e acordar bruscamente devido a uma freada. Salvo, seu ponto é o próximo. Todos os dias após descer no ônibus, caminha até o trabalho por pelo menos duas quadras. Hoje caminhou tentando resgatar o sonho perdido, a figura de alguém caindo?... mas desistiu ao chegar na frente do prédio. As pessoas do escritório, todas falando alto, ao mesmo tempo; tomando café, sons de teclados, telefones tocando - BOM DIA! - bom dia... refugiou-se na sua função, meio longe do pessoal, arquivando umas pastas, organizando papeis inúteis. 

Pegou suas coisas e saiu, passou pelo escritório, não era a mesma animação da manhã. Desfazendo seus passos pelas duas quadras que o separavam do ponto de ônibus, lhe veio uma vontade de voltar andando para casa, estava disposto, apenas quarenta minutos de caminhada. Abriu os dois primeiros botões de sua camisa e tirou a gravata; virou a esquerda na sorveteria, seguiu reto no restaurante do português, virou a direita no posto e subiu em direção ao parque: lembrou do corta caminho que o levava até perto de casa, uma pequena calçada em meio as árvores. Entrou no parque, passou pelos brinquedos e se enveredou pela calçadinha mal acabada.

Estava agora em um ponto alto do trajeto e era possível observar a cidade; final de tarde e um sol tímido no meio das nuvens, desaparecendo no meio dos prédios. Carrinhos lá longe engarrafando-se entre si, pessoas caminhando, voltando do trabalho, pegando crianças nas escolas, catadores de latinha, jovens despretensiosos, velhinhos a comprar pão; toda aquela movimentação da gente comum da cidade e suas rotinas. Ficou parado ali, imaginando qual seria a história de cada uma daquelas pessoas; seus medos, suas qualidades, os detalhes que tornavam-se invisíveis daquela distância. Notou as casas; entre elas, casas novas de uma arquitetura simples entre outras antigas, de batentes e janelas com adornos. As ruas que se cruzavam, tecendo a trama do trafego, conduzindo pessoas pelo passeio. Veio seguindo com os olhos a rua que descia em direção ao parque. E se antes a sua visão estava longe, agora começou a aproximar das coisas que haviam a sua volta. Logo a sua frente um pequeno morro que acaba num matagal e notou que dali era possível ver o prédio onde morava. Contou os andares e conseguiu achar o seu apartamento. Na pequena sacadinha, porém, notou uma pessoa parada.

Ficou olhando com atenção, mas não conseguia ver quem era. Notou que subitamente a pessoa virou-se em direção a ele; parecia estar observando-o também. Arriscou um aceno de mão, mas não teve resposta. A estranha figura virou-se para frente novamente e saltou do sétimo andar. 

Estava a menos de quinze minutos de casa e se pôs a correr;  desceu a rua do mercadinho, virou na padaria e seguiu reto até os prédios populares. Ao chegar na frente de seu prédio, nenhum alarde, nenhum corpo. Entrou no apartamento e não havia nada de diferente; foi em direção a sacadinha e olhou para baixo, nada de anormal. Parado, olhou ao redor e buscou a visão do caminho do parque; Notou alguém lhe acenando ao longe. 












segunda-feira, maio 27, 2013

Intenção.

 Walter Bird (British, 1903 - 1969) - “Reach for the Heavens”. Original vintage photoetching. 1938



Passos cautelosos
Na estreita passagem
Entre a luz e a escuridão

A natureza
De um caminho desconhecido

Estranha miragem
Criada pela nossa visão

O grande mistério é você

E as repostas
dependem da sua intenção

quinta-feira, fevereiro 14, 2013

Miragem de nós VII

Tantos os momentos felizes, quanto os momentos que nos fizeram chorar, passaram. Se você me perguntar o que resta, não vou dizer apatia. Nós ainda temos a batida do coração, os sonhos não realizados e a ajuda que gostaríamos de dar para as pessoas.

Nós ainda temos a respiração que acompanha nossos pensamentos e que uma hora ou outra nos faz sorrir ou chorar. Muitas vezes esqueci a razão de ser e estar aqui e acompanhei um fluxo que não me pertencia, me deixei levar só para ver até onde ia este fluxo, e o que aconteceu? Encontrei-me em uma situação na qual minha mente me obrigava a tentar lembrar a razão de ser e estar aqui. Ou seja, não adianta tentar fugir disto.

Como o fluxo de um rio que invariavelmente leva qualquer objeto inanimado para a queda de uma cachoeira. Felizmente, sempre no último momento consegui acordar e me segurar em alguma coisa, uma ideia, uma pessoa ou um sonho, até poder chegar em terra firme. Muitas vezes acordei só depois de ter caído. Quantas vezes você não me jogou a corda para me trazer de volta? Molhado, parado olhando o rio correr, arrastando tudo. Todas as vezes que isto acontecia eu sentia que tinha mudado. E logo as respostas que procurava eram outras.

O que faz chorar ou rir, depende da personalidade de cada um, de como encaramos os fatos no mundo. E em uma dessas reflexões a beira do rio, cheguei a conclusão que a personalidade não existe. A personalidade é uma prisão criada pela sociedade que faz com que as pessoas queiram ser umas mais interessantes que as outras. E se o caso é ser interessante, quem dita a regra do que é ou não interessante? A sociedade.

O motivo pelo qual tantas pessoas têm medo da mudança, é que ninguém quer deixar de ser quem acredita ser, mas a simples pergunta "Quem é você?" apavora tanta gente. Ou talvez eu seja o único que não saiba responder.

O caso é que não há como não mudarmos pois estamos constantemente evoluindo. A evolução aparece em cada segundo, de forma intensa ou despreocupada, porém sempre espontânea. Se tentarmos brecar esta evolução devido ao medo, somos levados pelo fluxo e arrastados como um objeto inanimado por seguidas quedas.

Se não existe personalidade o que existe então? Não sei dizer, mas eu poderia dizer que existem os outros. Em um intervalo entre os momentos felizes e tristes, neste momento onde não estamos preocupados somente com nós, podemos observar melhor os outros. E vendo desta maneira, sem pretensão de ser mais interessante que alguém, nós percebemos que embora não seja tão fácil descobrir a razão de ser e de estar aqui, pois a perguntas sempre mudam, uma resposta nunca deixa de fazer sentido: poder  ser a pessoa que joga a corda para alguém que não consegue sair do rio.

Esta resposta é como um norte para mim, quando estou quase esquecendo o que me traz aqui, eu paro.
E observo o fluxo.















sábado, janeiro 05, 2013

Plantas no jardim Pt II


As ideias que emitem  luz
Sobre nossa consciência
A verdade que se omite
Atrás de outras verdades

Os barcos naufragados
No oceano da ignorância
A simplicidade ingênua

Sorrir? Nem tanto assim

Janela aberta que revela o caminho
Para uma nova concepção

De tantas outras janelas abertas
Dentro de mim...